quinta-feira, 20 de agosto de 2015

Grécia, onde tudo começa: Atenas e Delfos

Atenas tem quatro milhões de habitantes e, no verão, dois milhões de turistas. É uma das cidades mais antigas do mundo, onde viveram Sócrates, Platão, Ésquilo, Sófocles, Aristófanes… A lista é extensa.

A vista da Acrópole, onde fica o Partenon, construído em homenagem à deusa Atenas e à criação do homem, domina a cidade.

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À noite, iluminado, ou durante o dia, o Partenon é de uma imponência ímpar. Mesmo em obras de restauração. É considerado o símbolo do poder de Péricles, estadista e personalidade política do século V a.C., que o mandou construir e governou durante o chamado “século de Péricles”, quando a democracia e o sistema jurídico atenienses alcançaram o ápice.

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Estudos e técnicas modernas descobriram que estátuas e monumentos gregos hoje em mármore branco eram originalmente coloridos.  A cor se perdeu com o tempo. E foi também com o tempo que outros países se deram o direito de saquear os tesouros de Atenas, contrabandeando-os para os mais respeitados museus do mundo. A ponto de, certa vez, um revoltado cidadão ateninese, com uma espingarda nas mãos, tentar evitar esses saques – infelizmente, sem conseguir.

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Ao lado do Partenon fica o templo de Erecteion, dedicado ao rei Erecteu e construído durante a Guerra do Peloponeso.

Nele, figuras femininas esculpidas em mármore – as Cariátides  – fazem as vezes de colunas. Esse conjunto é também chamado Pórtico das Virgens.

                    

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No Museu da Acrópole há tesouros como estátuas e segmentos do friso do Partenon, assim como registros do antigo cotidiano grego. Há também espaços vazios especialmente construídos para abrigar peças roubadas pelo diplomata inglês Thomas Bruce, o lorde Elgin, que se encontram no Museu Britânico, em Londres, as quais desde meados do século XX o governo grego pede sejam devolvidas.

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Um pouco adiante está o Templo de Hefesto, chamado Vulcano pelos romanos. Deus do fogo, dos metais e da metalurgia, seu templo é o mais bem preservado de Atenas, com colunas intactas, talvez por ter sido transformado numa igreja cristã no século VII d. C, e mais tarde, durante a dominação otomana, na principal igreja ortodoxa da cidade.

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As esculturas do frontispício, relativamente conservadas, representam cenas de lutas e interações entre homens e animais.

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Impressionante é a magnitude do Templo de Zeus, que originalmente tinha 104 colunas de 17 metros de altura por 2 de diâmetro.

O templo é um bom exemplo da  explosão de criatividade que as liberdades individuais e a igualdade propiciaram ao povo grego. Outras sociedades da época, como a egípcia, consideravam o poder autocrático indispensável à ordem.

Já pelos valores sociais gregos, a ordem não era incompatível com as liberdades individuais. Prevaleceram o racionalismo, o espírito do individualismo e a livre escolha dos cidadãos, que propiciaram o surgimento de tão expressivas obras de arte. E – nunca é demais lembrar - da democracia.

 

 

 

Visitar Atenas é emocionar-se com as marcas do passado – incontáveis ruínas de monumentos construídos por uma civilização que glorificava o ser humano como medida de todas as coisas – e também conviver com o drama do presente, a crise econômica que corrói a economia do país, cuja taxa de desemprego é 25%, e, entre os jovens, 50%.

Chegamos à Grécia dois dias após a vitória do Oxi – o “não” que o povo respondeu ao plebiscito governamental sobre as imposições da União Europeia: aumento de impostos, corte de gastos e reforma da previdência. O governo socialista de Tsipras defendia o Oxi, e cartazes oficiais mostravam isso. Mas a população também rechaçava fortemente as exigências, o que se podia verificar pelas pichações em vários pontos da cidade, reproduzidas aqui.

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“A Grécia não se vende”, disse-me uma grega sobre a crise que o Instituto de Investigação Econômica Leibniz disse ter beneficiado a Alemanha em mais de 100 bilhões de euros e, em menor proporção, os Estados Unidos, a França e a Holanda.

A situação é complexa. A vitória do Oxi trouxe esperança de ampliar a liberdade de negociação e a afirmação da soberania do país frente à União Europeia. Mas, com uma dívida considerada impagável e a falta de solidadariedade da Europa, a economia grega está no olho do furacão, e acordos desfavoráveis lhe são enfiados goela abaixo. Embora a Alemanha tenha tido sua dívida perdoada após a Segunda Guerra, Angela Merkel não considera a grandeza de fazer o mesmo em relação à Grécia.

O país se mostrava dividido. No dia seguinte à nossa chegada, a Praça Syntagma – a mesma que tinha acolhido protestos anti-austeridade na semana anterior – foi palco de manifestação favorável à aceitação das exigências dos credores internacionais, embora a maioria do povo tivesse manifestado o contrário no plebiscito.

Enquanto isso, os bancos, fechados por precaução governamental, liberavam só 60 euros por dia aos correntistas em longas filas diante dos caixas eletrônicos.

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Mas os turistas não eram afetados por esses problemas. E Atenas não se resume a ruínas históricas e crise econômica. A cidade é uma delícia. De certa maneira nos sentíamos como no Rio: as pessoas são relaxadas, simpáticas, hospitaleiras e se vestem de maneira descontraída, como os cariocas.

De dia ou à noite, passear pelo charmoso bairro de Plaka, no centro histórico, é a melhor pedida. Turistas e locais se confraternizam, tavernas colocam mesas nas calçadas, lojas de suvenires ficam abertas até tarde e músicos de rua animam o ambiente.

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Outro bairro interessante é Psiri, onde ficamos. Pertinho do nosso hotel, a taverna  Ta Kapamanaiaika, ou Karamanlidika, cuja gerente é uma espanhola que nos ajudava a entender o cardápio, oferecia deliciosos mezedés – petiscos típicos para serem comidos acompanhados por vinho ou cerveja. Folha de uva recheada com arroz e pinhões; pasta de grão de bico, coentro e alho; berinjelas recheadas com pasta de cebola, tomate e ervas; taramosaláta – pasta de ovas de vermelho com pão ou batata eram apenas algumas das guloseimas com as quais nos deliciávamos.

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Também em frente ao hotel havia uma espécie de feira livre, com cerejas, pêssegos e outras frutas, além dos fantásticos tomates gregos e azeitonas de variados tipos, cores, sabores e tamanhos. Lojinhas de bugigangas, que aparentemente nunca se fechavam, expunham objetos inusitados.

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Perto, mercearias vendiam uma variedade inesperada de nozes, amêndoas e outras frutas secas, além do famoso sal cor-de-rosa do Himalaia.

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No capítulo “figuraças”, um dos poucos mendigos que vimos segurava uma cruz ortodoxa e um terço, e um homem de chapéu de palha, barba comprida e saia negra passeava distraído lendo algo que parecia deveras interessante.

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Outras figuraças são os guardas do Parlamento e seu curioso balé, registrado em vídeo por Jitman Vibranovski.

                                                                                        Delfos: conhece-te a ti mesmo

A duas horas e meia de Atenas estão as ruínas de Delfos, Patrimônio Mundial pela Unesco. Chamada pelos antigos de Umbigo do Mundo, Delfos era um lugar sagrado, o centro religioso da civilização helênica. Lá ficavam o Templo de Apolo e o famoso Oráculo, onde há a inscrição  “Ó homem, conhece-te a ti mesmo e conhecerás os deuses e o universo”.

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O Oráculo de Delfos exerceu grande influência na Grécia e em países próximos, como Macedônia e Egito, cujos políticos e estadistas frequentemente recorriam a ele. Mas também cidadãos comuns o procuravam para indagar sobre problemas cotidianos, amorosos, financeiros e até meteorológicos. A mitologia e a dramaturgia gregas descrevem heróis e personagens, como Hércules e Édipo, consultando-o para saber os mistérios de seus destinos.

As respostas eram consideradas verdades absolutas. Mas o Oráculo – que funcionava no templo de Apolo, onde as sacerdotisas, ou Pitonisas, faziam profecias em transe - era às vezes ambíguo: o rei Creso da Líbia o procurou antes de atacar a Pérsia, e recebeu o aviso de que, se o fizesse, destruiria um grande império. Mas foi derrotado. Quando acusou o Oráculo de ter feito uma predição falsa, recebeu a resposta de que, de fato, um grande império tinha sido destruído: o dele.

Em agradecimento às consultas e aos benefícios advindos delas, Delfos recebia valiosas doações, e se tornou um centro de influência também financeiro. Em volta do Templo de Apolo havia capelas chamadas Tesouros, onde as oferendas eram guardadas. A mais importante, e única restaurada, é o Tesouro de Atenas, vista abaixo.

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O teatro, de onde se descortina vista panorâmica do vale de Delfos e do santuário de Apolo, podia receber cinco mil pessoas em suas 35 fileiras de assentos. Foi construído no século IV a.C., e remodelado diversas vezes.

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De acordo com a mitologia grega, a esfinge tinha sido trazida da Etiópia para Tebas pelos deuses Hera e Ares. Leão alado com cabeça de mulher, cauda de serpente e asas de águia, era um demônio de destruição e má sorte. O enigma “que criatura anda com quatro pernas pela manhã, duas à tarde e três ao anoitecer” foi decifrado por Édipo, depois de dezenas de pessoas terem sido estranguladas por não o conseguirem. O nome esfinge deriva do grego sphingo e significa estrangular.

O Museu Arqueológico de Delfos tem achados arqueológicos do santuário de Apolo e arredores. A esfinge e a estátua do belo Antinoo – favorito de Adriano, elevado por ele à categoria de semi-deus e citado por Marguerite Yourcenar em “Memórias de Adriano” – fazem parte do acervo. 

 

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Jóias, artefatos de decoração e objetos votivos são representativos da época de maior prosperidade, influência e prestígio do santuário.

Curioso é o que se diz da imagem de Apolo tendo ao lado uma ave: o dito popular “um passarinho me contou” seria derivado dessa imagem, em que Apolo recebe notícias de seus casos amorosos por intermédio de um pássaro.

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15 comentários:

  1. Olá Cláudia! Sou Diego Lima, estudante de Jornalismo de Atibaia/SP. Estou elaborando uma monografia com o tema "A presença das mulheres no telejornalismo esportivo" e gostaria de uma entrevista com a senhora que, além de jornalista, é socióloga acerca de como as mulheres vêem conquistando o espaço no cenário telejornalístico no Brasil. A senhora poderia nos conceder? Obrigado!

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    1. Olá, Diego, entre em contato comigo por email para conversarmos a respeito: claudiaversiani@gmail.com.

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  2. País incrível que o mundo todo precisa conhecer - e lá se vê gente de todo o mundo. Estive na Grécia em 2011, em plena crise, mas nem as greves que resultaram no fechamento de alguns museus, serviram pra tirar a força e o encanto da viagem. Lá se pode sentir a grandeza do início da história do Ocidente - até nas inúmeras e terríveis marcas da depredação deixadas por outros impérios, incluindo a Inglaterra.... e a dignidade do seu povo, mesmo encarando a pobreza. Delfos é um lugar belíssimo. E Atenas, uma cidade bonita e limpa : em plena greve do serviço de coleta de lixo, podia-se ver que entre os montões de sacos de lixo que não eram recolhidos, as ruas e calçadas continuavam impecáveis. Das ilhas, nem falo, merecem um capítulo à parte. Mas pra quem quer viajar por terra pelo interior, recomendo uma visita a Meteora, um lugar pra lá de incrível. Vontade de voltar, dá mesmo!

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  3. Que registro maravilhoso, Claudia! Uma verdadeira aula de história e arte!
    Obrigada.
    Bjs
    AT

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  4. Suas impressões sobre a Grécia (Atenas e Delfos) são muito boas e interessantes, destacando-se o berço da civilização ocidental nas artes, arquitetura, escultura e ciência, mas também na democracia!
    As fotos e filme mostram a beleza dos lugares visitados e convidam logo o leitor a fazer a visita turística a tão belo país...
    Parabéns pela mensagem geral mostrada!
    Bruno.

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  5. Muito bom, Cláudia! Um paralelo interessante entre a Grécia antiga e a contemporânea, permeado pela política. O sentimento que permanece enquanto pisamos o solo grego é o de reverência por aqueles que nos deixaram tanta beleza e inteligência em seus poemas épicos, na filosofia, no teatro, nas artes e na política.
    A Humanidade deve muito à Grécia. A retribuição não poderia ser menor que o perdão à dívida financeira que enriqueceu alguns bancos europeus. Zeus castiga!
    Parabéns por mais um capítulo do seu blog!!!

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  6. Guilhermino de Oliveira Filho23 de agosto de 2015 às 06:30

    Só vocês mesmos, Cláudia, para irem à Grécia justo agora.
    Beijo

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  7. Que espetáculo! E que maravilha de texto, Claudia!
    Parabéns!
    Sergio

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  8. Bárbara Musumeci Mourão23 de agosto de 2015 às 21:56

    Muito lindo, Claudia!
    Mesmo vendo as fotos pelo celular achei lindas e o texto está saboroso!
    Parabéns!
    Beijos,
    Barbara

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  9. Belas fotos! Bela reportagem! Beijos!

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  10. Pedro Henrique de Paiva24 de agosto de 2015 às 11:24

    Otimos textos! Muito obrigado,
    Pedro Henrique

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  11. Muito legal Claudia
    parabens pelas fotos maravilhosas
    adorei!
    Bjs

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  12. Vi e degustei com calma. Imagina alguns bancos enxotarem esse país da União Europeia!
    Continue viajando.
    C.B

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